PARA MEMÓRIA FUTURA

Uma narração simples de uma memória viva – sobre a importância do associativismo no desenvolvimento sócio-cultural do Chão da Parada.

São poucos os documentos e são poucas as memórias vivas que nos permitam desenhar uma História datada e detalhada da Aldeia do Chão da Parada, no que se refere ao Associativismo que se admite ter existido pelo menos desde o início dos anos 30 do século XX. Sabemos porém que, aquando da Batalha de Aljubarrota no ano de 1386, esta Aldeia já existia, conforme documento em arquivo na Torre do Tombo que refere ter o Rei D. João I doado os seus reguengos a um tal D. Simão, soldado que se teria destacado por bravura na referida batalha.

Todavia, verificados os conhecimentos ainda em memória viva, são conhecidos testemunhos de formas associativas, desde o início dos anos 30 do século XX, ligados sobretudo à prática do futebol, ténis de mesa e porventura modestos eventos recreativos. São conhecidos pelos menos dois locais que serviram de sede, um no n.º 50 da Rua da Capela e um outro no n.º 22 da Rua da Escola. Sabe-se ainda da existência de campos de futebol nos Casais Morgados em dois locais diferentes mas todos na proximidade do velho moinho ainda hoje existente. Já no final dos anos 60 os jovens da geração de 40, construíram à pá e enxada um novo campo de futebol nos terrenos então baldios da escola primária, local atual da ASCP.

É por isso certo que, pelo menos os poucos jovens que aos poucos iam obtendo conhecimentos literários, quiseram e souberam poucos anos após a implantação da República, dinamizar formas de vida associativa no Chão da Parada, para aconchego da sua vida social que seria à data degradante.

O Chão da Parada era e foi durante estes anos terra de gente rural, vivendo na escuridão, sem luz elétrica, sem água canalizada, sem saneamento e com ruas de areia solta, onde muito do sustento provinha tão só de uma agricultura de subsistência e o ganha-pão do trabalho de jornaleiro efetuado nos campos de arroz e milho do Talvay e das propriedades agrícolas-florestais dos poucos proprietários mais abastados da área geográfica do concelho de Caldas da Rainha, Óbidos e Alcobaça.

Todavia, a partir de meados da década de 30, os jovens mais saudáveis e que porventura já saberiam ler e escrever, iniciaram aquilo que foi o “caminho marítimo”, situação que alterou em muito os hábitos e condições de bem-estar das gentes do Chão da Parada. Este quase pleno emprego da população ativa, só veio a terminar nos finais dos anos 70. Foi por consequência desta aventura marítima que, alguns jovens da geração de 40 e muitos mais da geração de 50 e ainda muitos mais da geração de 60 se iniciaram em estudos académicos, primeiro pelo velho 5º ano da Escola Secundária e Liceu de Caldas da Rainha, com consequências lógicas em outros estudos superiores.

Entretanto, no início da década de 70 já era notório um querer diferente da juventude Paradense, no que dizia respeito ao associativismo, com especial incidência na prática do futebol, na organização de eventos teatrais e eventos recreativos diversificados. Todavia, a grandeza dos atos, por mais modestos que fossem, continuavam ainda a ser balizados pelos informadores pides, do regime político vigente. Ainda assim, a geração dos anos 40 e 50, estava agora no mar, na tropa, na guerra, emigrada e poucos ainda em estudos superiores. Porém, o Chão da Parada continuava uma aldeia cinzenta, sem luz elétrica, sem água canalizada, sem saneamento e ainda também, com as ruas em terra solta. Aconteceu pois em meados dos anos 70, aquilo que muitos destes jovens, já adivinhavam vir a acontecer.

Foi assim, a 25 de Abril de 1974, abriram-se novos horizontes a todos e especialmente aos jovens. Entretanto, a luz eléctrica, tinha acabado de chegar. A juventude Paradense não perdeu tempo e sem querer esperar por ninguém, agarrou com unhas e dentes a abertura ávida na sociedade Portuguesa e sem demora deu início aos trabalhos de reorganização do associativismo existente, tendo em mente a constituição com força legal e jurídica da Associação Cultural e Desportiva Paradense – ACDP. Os mais vividos na turbulência dos anos anteriores, na tropa, na guerra e nos estudos e conhecedores por isso das consequências da abertura democrática que o 25 de Abril ia permitir, tomaram com empenho criativo, físico e material o sonho de constituir a ACDP.

Assim nasceu a primeira sede, numa casa velha situada no n.º 46 da Rua da Escola cedida graciosamente. Foi ali que se deram os primeiros passos para a criação da ACDP, foi ali que nasceu o grupo de teatro com a produção da peça “Hó Natal Natal” que foi exibida em muitos palcos em campanha de dinamização cultural do então Movimento das Forças Armadas, foi ali que se projectaram grandes torneios de futebol no pequeno velho campo de futebol, foi ali que se desenharam os Estatutos, foi dali que se partiu para a escritura de constituição jurídica e foi ali que foram eleitos os primeiros Corpos Gerente em substituição da Comissão pró Associação. Tinha pois, decorrido cerca de um ano de altos e baixos, avanços e recuos por medos, tendo em conta o período alucinante que então se vivia em Portugal. Todavia, os mais conscientes que só queriam o futuro promissor do Chão da Parada, não se amedrontaram e concluíram o objetivo.

Posteriormente, a ACDP muda-se para uma velha casa situada no n.º 4 da Rua da Escola, por lá passa os anos de 1976/77. São anos de afirmação social, continuando-se com a criação de espectáculos de Teatro, jogos de futebol e se inicia a grande discussão para construção do Edifício Sede Social que culmina com a elaboração do projecto e se inicia em Abril de 1977 a sua construção, ainda aqui houve a tentativa da montagem de um Posto Médico legal. Entretanto a ACDP muda-se para novas instalações, mais uma velha casa abandonada situada no n.º 8 da Rua de Baixo. É ali que além da continuidade do trabalho sócio-cultural em curso se iniciam cursos de Alfabetização e aulas preparatórias para os estudos secundários, se requalifica o campo de futebol, se faz a escritura de doação dos terrenos onde hoje se situa o complexo social da ASCP e se projectam e executam as alterações das ruas envolventes e a alteração do curso de água da Rua da Cheia. É ali ainda que se coloca se não a primeira uma das primeiras televisões a cores do Chão da Parada e é dali que se faz a mudança no início dos anos oitenta para o Edifício Sede já em parte construído, bar, secretaria, instalações sanitárias, sala de jogos e balneário.

A ACDP, já usufruindo do seu edifício sede social ainda que em continua construção na parte do salão polivalente, dá de facto o salto de qualidade na promoção das suas valências sócio culturais, projetando-se desde logo a criação de outras. Decorre o início da década de 80. A geração de 50, salpicada já por muitos da geração de 60 e ainda com alguns da geração de 40 lidera com criatividade e empenho o esforço físico e financeiro voluntário dos Paradenses residentes ou espalhados pelo país ou pelo mundo. Eram de facto tempos de grande unidade que se espelhava em todos os eventos que se realizavam. Esta década de 80 e ainda parte da de 90; tempos ainda distantes do avanço tecnológico que nos levou a um mundo audiovisual muito diferente; é pródiga na realização de espetaculares eventos culturais, desportivos e recreativos e na criação de grupos de cultura que calcorrearam o País de lés a lés, nomeadamente o Grupo de Teatro com as peças o “Médico à Força” e o “Barbeiro de Sevilha” e os Ranchos de Folclore Adulto e Infantil ainda e também foram anos de ouro da equipe de futebol sénior que marcava presença em tudo o que era torneio quadrangular ou campeonato, foram ainda tempos do lançamento de classes de ginástica, da compra dos terrenos para construção do novo campo de futebol, este já de medidas oficiais e a construção no local do velho campo do recinto Polidesportivo com balneários.

Mas a ACDP, com muitos dos mesmos que nela se iniciaram em dirigismo, logo nos meados de 1974, sentindo que a sociedade civil, já não precisava da mesma forma das atividades produzidas por ela e ainda tendo em conta o abandono por desgaste temporário e profissional dos grupos mais atuantes, Futebol, Folclore e Teatro e o avanço cada vez mais atuante na vida das pessoas do mundo virtual de hoje, teve capacidade e engenho, para requalificar a ACDP e aos poucos transformá-la numa IPSS alterando-lhe por força de disposição legal o nome para Associação Social e Cultural Paradense – ASCP.

Assim aconteceu, com igual ou familiar (os tempos hoje são outros) empenho criativo e material os dirigentes a partir dos finais da última década do século passado, souberam explorar muito bem os apoios sociais que os governos de então punham à disposição, para o apoio às crianças e aos idosos. Mais uma vez, a sociedade Paradense era pioneira no mundo rural, a projetar obra válida para as suas gentes e outras do espaço geográfico confinante.

No presente e já com o novo Edifício Social concluído e o anterior totalmente requalificado para o efeito, dá apoio nas várias valências, a 132 crianças em idade de creche, pré escolar e ATL, a 26 idosos em centro de dia, 49 em serviço de apoio domiciliário e almoço diário a 81 crianças do 1º ciclo, contando para o efeito com mais de 50 funcionários e 11 viaturas de transporte e apoio.

Ainda assim, importa referir que a ASCP mantêm em funcionamento outras actividades que vão desde as desportivas, nomeadamente o Tiro com Arco, o futebol sénior (velha guarda), o futebol de salão, as aulas de ginástica de manutenção, às culturais como o funcionamento de uma biblioteca, o curso de iniciação ao Teatro e as conferências temáticas à realização de eventos direccionados para a venda e ou mostra de literatura, arte, lazer e vendas de garagem de produtos diversificados.

Posto isto, há 38 anos o Chão da Parada, era de facto uma Aldeia rural muito desumanizada, com condições de habitabilidade e utilização primárias, quer nos espaços habitáveis quer no espaço urbano, decorrido este tempo, pode afirmar-se que os Paradenses, souberam dar continuidade à semente que sempre existiu nas suas gentes, talvez até muito antes dos anos 30 do século XX, souberam porque acreditaram, acompanhar em proveito próprio e da comunidade em geral, o que de positivo sócio cultural, a construção da democracia permitiu, pese embora as anestesias cívicas de alguns que teimosamente, nunca quiseram compreender.

Não importa agora, contabilizar as significativas doações criativas, físicas e financeiras das mulheres e homens Paradenses ou não, espalhados por todo o mundo, assim como as muitas Entidades oficiais que no decorrer do tempo foram chamados a prestar subsídios, importa sim olhar com orgulho, o vasto património material e humano que a Associação Social e Cultural Paradense possui. Os líderes não se esconderam nem se escondem, a história reconhece-os e recorda-os.

A finalizar, refere-se que a pluralidade dos temas aqui descritos, são tão só sinais dos tempos recentes, em memória viva do autor, acreditando que geração alguma, deixará de dar continuidade ao Associativismo sócio cultural no Chão da Parada.

O sonho sempre comandou a vida!

Chão da Parada, Outubro 2013

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